Agropolo compõe plataforma de relacionamento entre institutos de pesquisa, universidades e empresas

Por Carla Gomes (MTb 28156) – Jornalista científica, Assessora de Imprensa do Instituto Agronômico, IAC.

O ritmo da inovação tecnológica e a acentuação da competição no sistema de inovação têm alcançado níveis que exigem, cada vez mais, dos diversos atores da pesquisa e do desenvolvimento uma capacidade permanente de aprendizagem e de incorporação de novas tecnologias, que os capacitem a gerar produtos competitivos. O elemento da sustentabilidade também ganha importância neste cenário, que coloca a necessidade de inserir novos atributos aos processos de ciência, tecnologia e inovação (CT&I), proporcionando resultados inovadores do ponto de vista ambiental.

A ideia de um sistema de inovação competitivo relaciona-se diretamente com o elemento da interação entre os participantes desse sistema, em um formato que priorize também a internacionalização das organizações. Nesse sentido, instituições que se destacam no desenvolvimento da CT&I na cidade de Campinas firmaram, em 2015, uma parceria com a Associação Agropolis International, sediada na França, para a constituição do Agropolo Campinas-Brasil. Participam desse grupo a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, por meio do Instituto Agronômico (IAC), Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL) e Instituto Biológico (IB), Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, Prefeitura de Campinas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Techno Park Campinas – Associtech e Associação Agropolis International. Como intervenientes desse acordo estão a Embrapa e o Consulado Geral da França, em São Paulo.

O Agropolo Campinas-Brasil constitui uma plataforma interinstitucional fundamentada no conceito da inovação colaborativa, que tem por objetivo desenvolver projetos de cooperação técnica nas áreas de agricultura, alimentação, biodiversidade, bioenergia, química verde e desenvolvimento sustentável.

O diretor-geral do IAC, Sérgio Augusto Morais Carbonell, que atua como coordenador da secretaria executiva do Agropolo Campinas-Brasil, aponta que este arranjo constitui uma plataforma de relacionamento que propicia uma grande abertura de oportunidades e complementariedade para os atuantes no universo da agricultura e áreas afins. “O relacionamento no Agropolo Campinas-Brasil incentiva a pesquisa além da rotina científica, que agrega novidades para gerar novas soluções disruptivas e baseadas na essencialidade, competitividade e na pesquisa responsável, alicerçada na credibilidade das instituições envolvidas no acordo”, resume.

Sérgio Augusto Morais Carbonell

Sérgio Augusto Morais Carbonell
Diretor-Geral do IAC

O diretor do IAC destaca que a finalidade da pesquisa é o avanço da qualidade de vida da população, com melhores produtos e serviços, empregos e renda. “Essa tem sido a principal diretriz para a organização da programação científica no IAC”, afirma. O Agropolo Campinas-Brasil irá contribuir a partir da organização de workshops para definir os temas que serão trabalhados no conjunto de projetos para captação de recursos em agências de fomento. “A bioeconomia, tema que fundamenta o Agropolo Campinas-Brasil, agrega os esforços das diversas organizações participantes, é, sem dúvida, o motor para o sucesso desse acordo de cooperação técnico e científico”, diz.

Carbonell explica porque o IAC participa efetivamente do Agropolo Campinas-Brasil. Para ele, essa é uma oportunidade de inserção em modelo de C,T&I mais moderno, o que trará, com certeza, maior dinâmica e capacidade de responder às demandas do setor produtivo. “Esse ambiente de interação, em diversos níveis, apresentará ao IAC um processo de aprendizagem em que a nova competência de relacionamento com ambiente externo irá deixar o Instituto mais competitivo”, considera.

O diretor do IAC acredita que o Agropolo Campinas-Brasil intensificará o processo de internacionalização dos resultados da pesquisa. “O Agropolo terá essa função, semelhante a um braço operacional externo. Até o momento, além da França, já temos acordo com a Holanda, que irá também agregar esforços para o sucesso do Agropolo Campinas-Brasil”, diz.

Segundo Carbonell, para Campinas o benefício virá na forma da conquista de desenvolvimento territorial, graças à atração de capital e empregos. “A cidade irá firmar o conceito de polo de ciência e tecnologia, principalmente nos diversos segmentos da agricultura e da inovação relacionados à indústria e ao comércio”, considera.

As indústrias precisam não só de processos e produtos, mas também das qualificações necessárias para acompanhar as novas concepções. Essa dinâmica cria a necessidade de conhecimentos especializados que, muitas vezes, não são gerados internamente, em suas atividades cotidianas. A velocidade das transformações hoje em dia é muito alta, o que altera a rotina dos mercados, com redefinição das linhas de produção, especialização em alguns segmentos das cadeias de produção e surgimento de novos nichos do mercado.

“Estamos reunindo um grupo de competências que, a exemplo de Montpellier, no futuro, será referência no setor científico e tecnológico no ambiente agro. Vamos contribuir também para a formação de recursos humanos voltados para elaboração de processos e produtos e, principalmente, promover a inovação junto com o setor de produção, ou seja, com a iniciativa privada, elo fundamental neste processo exitoso do Agropolo Campinas-Brasil”, afirma o diretor do IAC.

A parte privada do Agropolo Campinas-Brasil, representada pelo Techno Park, em Campinas, traz informações sobre como deve ser a participação de empresas, considerando PD&I e retorno financeiro.

Confira a seguir a entrevista com o representante do Techno Park, José Luis Guazzelli, engenheiro civil, cônsul honorário da França em Campinas e diretor da Associtech, entidade gestora do Techno Park.

Conceitue, por favor, o Techno Park e apresente-o ao leitor de O Agronômico. Qual a inspiração para a constituição desse aglomerado?

José Luis Guazzelli: A partir de uma iniciativa da diretoria da empresa Tecno Park Empreendimentos, em uma área de 540 mil m², em 1997 foi iniciada a implantação do empreendimento que está localizado no entroncamento das Rodovias Anhanguera, D. Pedro I e Bandeirantes. Seu projeto está embasado na tríade: localização, compartilhamento de serviços e ambiente de colaboração, evidenciando as características que despontaram nos anos 80: diferenciais atrativos para a localização de unidades produtivas e de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I).

O Techno Park nasceu inspirado no conceito de um business park, mas a atração de 44 EBTs – empresas de base tecnológica – nos últimos anos permitiu sua transição para o conceito de parque tecnológico, reconhecido em dezembro de 2015 pelo Governo de São Paulo, que credenciou o Techno Park como integrante do “Sistema Paulista de Parques Tecnológicos” (SPTec).

Atualmente, estão instaladas no Techno Park 62 empresas, com 4.000 postos de trabalho. Entre estas, estão 44 caracterizadas como sendo de base tecnológica (EBTs) em diferentes segmentos de atuação, sendo 13 em “Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC)”, 15 em “Ciências da Vida”, três em “Agroalimentar” e 13 em “Automação, Mecânico-Automotivo”. Essas empresas contam com, aproximadamente, 1.840 postos de trabalho.

O Techno Park Campinas pode ser apontado com um dos pioneiros a concretizar o modelo de um condomínio empresarial no Brasil ajustado ao conceito de parque tecnológico conduzido pela iniciativa privada.

Quais fatores despertaram o Techno Park para fazer parte do Agropolo?

José Luis Guazzelli: O principal fator que levou o Techno Park a integrar o Agropolo é a nossa convicção de que seu modelo contribuirá para a aproximação entre as indústrias e os centros de conhecimento e estimulará o surgimento de startups nos setores da agroalimentação e bioeconomia na região de Campinas.

Os entendimentos entre a Unicamp e Agropolis iniciaram-se em 2001, com participação de João Carlos de Souza Meirelles, atual Secretário de Energia, e pelo atual reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge. Em 2003, foi assinado um protocolo de intenções entre a Prefeitura de Campinas e a Região de Montpellier, com a interveniência do Consulado da França e do Techno Park. Naquele momento, reunimo-nos com Luís Augusto Barbosa Cortez, vice-reitor da Unicamp, e com o prefeito de Montpellier, George Frêche para prosseguir com os entendimentos multilaterais para a criação de um Centro de Conhecimento em Campinas, nos moldes de Agropolis Montpellier Fr.

Mais recentemente, em junho de 2015, com ingresso do IAC, foi constituída a secretaria executiva do Agropolo, sob a responsabilidade do doutor Sérgio Carbonell e foi assinado o arrojado “Acordo de Cooperação”, quando o Techno Park passou a integrar o Conselho do Agropolo Campinas Brasil.

Como o conjunto de empresas instaladas no Techno Park se relaciona com institutos de pesquisa e universidades no Brasil e no exterior? Há parcerias envolvendo investimentos e transferência de pacotes tecnológicos?

José Luis Guazzelli: Hoje as empresas instaladas no Techno Park já se relacionam com instituições renomadas, como USP, Unicamp, ITA, IPT e IAC.
A intensidade desses relacionamentos pode ser avaliada através de enquete que realizamos no ano 2015, que mostrou que 81% das empresas de base tecnológica (EBTs) mantêm atividades de PD&I, 35% do total das EBTs possuem um centro de PD&I em sua unidade instalada no Techno Park e 68% do total das EBTs trabalham em colaboração com universidades, centros de pesquisa e/ou agências de fomento.

Essa relação também é intensa com instituições internacionais, como é o caso do Instituto VEDECOM Fr, cujo foco está voltado à ecomobilidade, BIC Business-Innovation Center de Montpellier Fr, que conduz modelo exemplar de incubação e aceleração de empresas, e com CVT SUD Fr e CIRAD, que reúnem os mais importantes institutos de pesquisa franceses no setor agroalimentar.

O acordo de cooperação com o CVT e CIRAD foi promovido pelo Techno Park, tendo por objetivo a avaliação de sistema de armadilha para captura, controle e erradicação da Broca do Café, na Fazenda DATERRA, em Patrocínio, Minas Gerais. Esse tema é relevante na medida em que foca a qualidade e a produtividade da cultura de café, um dos principais itens da pauta de exportações brasileiras, e ainda poderá trazer contribuição à sustentabilidade da cafeicultura, pois poderá eliminar o uso de toneladas de defensivos agrícolas, atualmente empregados para conter a Broca do Café, sendo que grande parte é carreada para os mananciais de água.

Se não há parcerias, como essas empresas (em sua maioria, ao menos) se relacionam com esses geradores de tecnologias, produtos e serviços para incorporar essas ferramentas em suas atividades?

José Luis Guazzelli: Como exemplifiquei anteriormente, existem parcerias. O que se deseja é encurtar o tempo para a transformação do conhecimento em produto, favorecendo a pesquisa aplicada no âmbito dos Parques Tecnológicos.

Aproveito sua pergunta para reafirmar o que parece ser consensual: preferencialmente, as parcerias tecnológicas devem contar com a participação das universidades e instituições de pesquisas e das empresas, mas nada impede que o desenvolvimento tecnológico ocorra através da interação das empresas com seus clientes e fornecedores dentro de um processo endógeno.

Os países mais avançados tecnologicamente adotam a premissa de que as inovações devem ser geradas no polo produtor em parceria com os centros de conhecimento, daí a importância do Agropolo Campinas Brasil. São ações deste tipo que, em longo prazo, permitirão reduzir o défice da balança tecnológica do Brasil.

De zero a dez, como o senhor pontua a interação entre empresas e institutos de pesquisa e universidades no Brasil?

José Luis Guazzelli: Posso pontuar com a nota 5,0 (a média), pois embora as iniciativas sejam primorosas no âmbito acadêmico, temos muito a avançar para transformar esses conhecimentos nacionais em oferta de novos produtos e processos inovadores de elevado valor agregado.
A trajetória histórica da base científica e industrial do Brasil mostra a divergência entre os interesses da indústria e da academia, o que pode ser explicada pelas políticas contraditórias, observadas ao longo da nossa história, que fizeram com que não tenham sido adotadas estratégias eficazes para aproximação entre esses dois atores.

O Brasil ainda está longe de gerar tecnologia competitiva o suficiente para garantir espaço entre os grandes players mundiais em setores estratégicos da economia. O País demonstra pouca capacidade de absorver as tecnologias dos países desenvolvidos e de gerar inovações próprias. Essa constatação explica o fato de o Brasil ocupar a triste colocação de 29ª posição no ranking de patentes válidas registradas no “U.S. PATENT AND TRADEMARK OFFICE” (www.uspat.com) e a modesta 19ª posição no número de patentes válidas no Brasil, até 2012, segundo a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (ANPROTEC).

Essa realidade fez com que, a partir de 2010, a pauta de exportação brasileira voltasse à situação do início dos anos 50, a saber: produtos primários 49% versus produtos industrializados 37%. Fica claro que, para revertermos esse quadro, falta incentivo público mais eficiente, que é o compartilhamento universal do risco tecnológico entre Estado e empresa, como ocorre nos países do Norte e da Ásia.

Como o Agropolo poderá auxiliar para fazer evoluir essa interação?

José Luis Guazzelli: Exatamente pelo fato de o Agropolo Campinas Brasil estar embasado no conceito da “Tríplice Hélice”, termo cunhado por Henry Etzkovitz para descrever o modelo de inovação com base na relação governo-universidade-indústria, pois somente através da interação desses três atores será possível criar um sistema de inovação sustentável e durável, na era da economia do conhecimento. Um ótimo exemplo dos resultados que podemos esperar a partir do Agropolo pode ser identificado na Coréia do Sul, relacionado aos mecanismos de geração e gestão de parceria Governo-Universidade-Empresa.

A atuação do Agropolo poderá servir para atrair outras empresas da área do agronegócio para o Techno Park?

José Luis Guazzelli: Com certeza! E esta certeza não é apenas intuitiva ou despertada apenas pelo entusiasmo dos que participam do Agropolo, mas é também embasada nos resultados obtidos por plataformas semelhantes ao Agropolo, como é o caso de Agropolis Internacional e dos polos de competividade franceses, do Silicon Valley, na Califórnia-USA, e na Coreia do Sul, entre dezenas de outros exemplos exitosos no mundo.

Os membros do Agropolo Campinas Brasil têm a convicção de que essa plataforma proporcionará, juntamente com outras iniciativas, um salto em competitividade para a Região de Campinas, atraindo outras empresas de base tecnológica nos segmentos de agricultura, biotecnologia, bioenergia e desenvolvimento sustentável.

O Techno Park quer fazer parte desse processo e está preparado para receber novas demandas. Atualmente, já se encontram instaladas no Techno Park renomadas empresas do setor agroalimentar, como a ETH Bioenergia, a FMC Agricultural Solution, a AGCO, a AMYRIS, a DSM, a GranBio, a Nanocore Biotecnologia, a OXITEC, a EBES, a Ecolab e a Vignis.

Quais modelos podem ser seguidos para melhorar esse relacionamento, considerando similaridades com a região de Campinas?

José Luis Guazzelli. É preciso investir para que os projetos de PD&I, em curto e médio prazo, transformem conhecimento em produtos inovadores de interesse da sociedade.

Para tanto será indispensável contar com a competência dos centros geradores de conhecimento, a força das instituições de fomento, o empreendedorismo tecnológico da iniciativa privada e a introdução do conceito compartilhamento universal do risco tecnológico entre Estado e empresa, como se dá nos países do Norte e da Ásia.

No campo dos incentivos fiscais, o município de Campinas e o Estado de São Paulo consolidaram, nos últimos três anos, um conjunto de legislações que incentivam instituições (universidades, institutos de pesquisas e centros de conhecimento), empresas, pesquisadores públicos e inventores a participarem de processos de inovação tecnológica.

Mais um passo está dado. A seriedade e a importância das instituições responsáveis pela condução do Agropolo Campinas Brasil representam a garantia de que o trabalho contínuo resultará no transbordamento de resultados relevantes para a sociedade.

José Luis Guazzelli,

José Luis Guazzelli
Representante do Techno Park