Entrevista com o Secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim
1. O Instituto Agronômico completa 130 anos em 2017. Que balanço o senhor faz das contribuições do IAC ao longo desse período?
O Instituto Agronômico de Campinas (IAC) teve e tem papel preponderante no desenvolvimento da agricultura paulista e brasileira. Sua história se confunde com os avanços da própria atividade rural, pois, em 1887, período que antecedeu o abolicionismo no Brasil, Dom Pedro II fundou a instituição com o objetivo de fundamentar o trabalho no campo em bases científicas. Graças à pesquisa e à inovação desenvolvidas pelo nosso IAC desde o século XIX, importantes variedades de cultivares têm sido introduzido no sistema produtivo do País, permitindo maior produtividade no campo. Em total sintonia com as diretrizes do governador Geraldo Alckmin para a Pasta, o trabalho do Instituto visa promover uma agricultura harmônica com o meio ambiente, preocupando-se em preservar os recursos naturais. Nesse sentido, o IAC foi pioneiro no Brasil em montar laboratório para análises de solos para recomendação de adubação, estabeleceu os parâmetros para definição de práticas conservacionistas para os diferentes solos e culturas do Estado e, mais recentemente, colaborou com o estabelecimento de novas práticas de produção sustentável, com parâmetros para a conservação do solo no plantio da cana-de-açúcar e a elaboração de um material com orientações ao produtor rural. As ações recentes se estenderam ainda ao Projeto Nascentes de Holambra, desenvolvido pela Secretaria, que busca a conservação de 171 nascentes e da vegetação lindeira. E vai além: fixam conceitos novos de tratamento do solo e cuidados com recursos hídricos em tempos de mudanças climáticas. Em 130 anos de atividades, as ações do IAC trouxeram melhoria da qualidade de vida, transformando a pesquisa e gerando tecnologias e cultivares que levaram competitividade para a agricultura e benefícios à sociedade.
2. Como o senhor avalia a influência do IAC na formação dos demais institutos da Secretaria de Agricultura e também em outras instituições de pesquisa agrícola no Brasil?
Sem dúvidas, a produção científica gerada pelo IAC, que resultou no fortalecimento e no crescimento de diversas culturas agrícolas em todas as regiões do Estado, foi um grande fator impulsionador das pesquisas em outras áreas. Assim, com a necessidade de desenvolver técnicas mais avançadas em outras frentes da agropecuária paulista, bem como promover o controle de pragas e doenças, procedimentos para conservação e armazenagem de alimentos e análises e estatísticas do setor, os demais institutos de pesquisa foram constituídos: de Zootecnia, em 1905; Biológico, em 1927; de Economia Agrícola, em 1942; de Tecnologia de Alimentos, em 1963; e de Pesca, em 1969. Hoje a produção dessas instituições tem dado uma inestimável contribuição ao produtor em termos de ganho de produtividade no campo.
3. A imagem do IAC é muito associada à cultura do café, sobretudo pelo fato de o Instituto ter sido criado por D. Pedro II para pesquisar os cafeeiros. Mas os trabalhos e as contribuições do IAC vão muito além da cafeicultura. Por favor, comente.
Cerca de 90% dos cultivares de café arábica do País provêm das pesquisas realizadas pelo IAC nas últimas décadas, totalizando mais de 60 variedades registradas. Esse reconhecimento se deve à presença marcante da pesquisa paulista em um dos principais produtos da nossa agricultura. No entanto, o aumento de produtividade graças ao trabalho do IAC se estende a diversas culturas, contribuindo para ampliar a qualidade das hortaliças, frutas, grãos, leguminosas, tubérculos etc. O Instituto foi pioneiro no melhoramento genético de plantas, pois havia necessidade de desenvolver cultivares adaptados para as condições tropicais já que se tratava de introduções da Europa ou Estados Unidos, com clima bem distinto do nosso. Por meio do seu Centro de Cana, em Ribeirão Preto, o IAC se tornou importante referência no desenvolvimento de cultivares, conferindo projeção internacional a ações como o Programa Cana IAC. Recentemente, os cultivares têm sido objeto de parcerias com países como México e Peru. O desenvolvimento das Mudas Pré-Brotadas (MPB) elevou a produção canavieira a outro patamar, à medida que reduziu o consumo de 20 para duas toneladas de mudas, revertendo uma quantidade maior de cana para a indústria e ampliando a produtividade. Destaco ainda o Centro de Citricultura Sylvio Moreira, que teve e tem impulsionado decisivamente esse setor.
4. Ao longo de sua história, o IAC desenvolveu 1.060 cultivares, de 99 espécies, incluindo grãos e fibras, café, flores, frutas e hortaliças, tubérculos, citros, seringueira e outras. Como o senhor vê o futuro do desenvolvimento de cultivares, considerando as demandas atuais e as que estão por vir?
O desenvolvimento de cultivares assegura tecnologias mais assertivas para a produção agropecuária, levando em consideração as condições de uma região, resistência a pragas e doenças e processos ambientalmente sustentáveis. Por isso, cada vez mais o setor deve recorrer às inovações tecnológicas, o que se reverte em maior produtividade, renda e qualidade para o pequeno, médio, grande produtor e agricultor familiar. A sanidade é cada vez mais exigida no mercado internacional, por isso a produção direcionada por técnicas comprovadas é um fator determinante para que o Brasil atinja novos mercados e seja cada vez mais um fornecedor de alimentos e produtos de qualidade reconhecida para o mundo. Novas fronteiras da genética, da intragenia, paralelamente às exigências de introduzir cada vez mais fatores biológicos na produção de insumos e defensivos, são desafios contemporâneos que têm sido incorporados pelo IAC.
5. Desde a criação do Instituto, o cenário mudou completamente — o IAC foi o único na pesquisa agrícola durante certo tempo. Porém, há algumas décadas, ele atua em um espaço competitivo, onde protagonizam outras instituições públicas e privadas que competem por mercados, por reconhecimento e por recursos. Como o senhor avalia as oportunidades e os desafios para a continuidade do IAC e dos demais institutos da Secretaria?
A inovação tecnológica é uma tendência para o setor e há, sem dúvidas, muito espaço para o desenvolvimento de práticas que aprimorem a produção e facilitem a vida do produtor rural. No planejamento anual das atividades dos institutos da Secretaria, realizado no início de 2017, ficou muito claro que, dentro do setor de pesquisa, a prioridade será ampliar as parcerias com o setor produtivo, por meio dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs), criados no âmbito dos seis institutos de pesquisa da Pasta. Estamos preparados para receber informações e demandas e, por outro lado, desenvolver estudos que vão nos conduzir a uma contínua produção de conhecimento a serviço do agricultor e da produção. No ano em que completará 130 anos de atividades, o IAC lança novos cultivares e passa por uma grande reformulação de suas instalações, o que, certamente, impulsionará ainda mais suas atividades.
6. O IAC segue atuante em seus 130 anos também por conseguir fazer bom uso de sua tradição, associando-a à modernidade, de modo a atender às demandas atuais e permanecer com credibilidade em meio ao setor. Nesse cenário, como o senhor situa a relevância dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NIT), que sua gestão tem apoiado e incentivado?
A parceria entre o setor público e privado é um importante recurso para que a pesquisa seja direcionada às reais necessidades e demandas de quem, de fato, está envolvido no processo produtivo. Por este motivo, a criação dos NITs é um importante passo para estimular a produção científica no Estado. Por meio desses organismos, já foram firmadas parcerias para desenvolver melhores soluções de controle de pragas e doenças. Hoje 17% do orçamento é composto pela captação de recursos junto à iniciativa privada, mas nossa expectativa é ampliar esse percentual para 25% até 2018. Os NITs também serão importantes para incentivar os pesquisadores, que passam a ter participação nos rendimentos provenientes das pesquisas exploradas pela sociedade. Profissionais mais motivados e com uma estrutura mais adequada e incentivos financeiros podem desenvolver mais e melhor em prol do segmento agropecuário paulista e brasileiro.
7. O IAC tem forte relação com o setor privado também na prestação de serviços, por meio de laboratórios acreditados pelo Inmetro. Algumas áreas, como solo e citros, estão preparadas e equipadas para esses atendimentos. Outras caminham nesse sentido. Como estará o IAC nos próximos 20 anos?
O desenvolvimento tecnológico e a inovação científica fazem parte do futuro da agropecuária. Cada vez mais, a adoção de processos comprovadamente produtivos será determinante para que o Brasil atenda às expectativas de abastecer o mundo com alimentos de qualidade e acessíveis à população. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o desafio será ampliar em 70% a produção mundial de alimentos, o suficiente para uma crescente população que, até 2050, deverá chegar a nove bilhões de habitantes. O Brasil poderá ser um grande protagonista desse cenário, fundamentado pela inovação gerada pela pesquisa paulista.
8. Além de desenvolver pacotes tecnológicos que envolvem desde o pré-plantio até a pós-colheita de diversas culturas, o IAC também se dedica à transferência desses conhecimentos e tecnologias. Realiza e participa de eventos para diversos públicos, comunica-se com o setor por meio da imprensa, capacita profissionais, inclusive com a Pós-Graduação em Agricultura Tropical e Subtropical. O público conhece e reconhece essas contribuições ou é preciso expor e interagir ainda mais?
Tão importante quanto fomentar a produção científica é impulsionar constantemente a transmissão desse conhecimento aos agentes do processo produtivo. Essa é uma diretriz do governador Geraldo Alckmin que temos reforçado a todos os institutos de pesquisa. No IAC, a transformação das técnicas em resultados eficientes ocorre em todos os elos da cadeia produtiva e deve ser cada vez mais incorporada à realidade da Pasta. São workshops, seminários, reuniões, palestras e capacitações voltadas não só aos técnicos mas também aos estudantes que já assimilam as informações para aplicação no futuro.
Tais ações acompanham a mudança de perfil do homem que atua no campo. Hoje em dia, o produtor rural busca se atualizar sobre as práticas que trazem melhorias ao seu trabalho, por isso a divulgação das ações do IAC por meio da imprensa, site do instituto e publicações como O Agronômico são de extrema importância para fazer chegar a informação a quem realmente interessa. Aprimorar essa comunicação e levar informação de qualidade ao homem do campo são desafios constantes para os próximos anos. Vida longa ao IAC!
Arnaldo Jardim
Secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo